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Palavras Corrompidas

Nucleo Perfoma Teatro

Texto: Livremente inspirado em Hugo von Hofmannsthal "Carta de Lorde Chandos"

Criação e encenação: Matteo Bonfitto

Sesc Ipiranga

Se ainda há caráter messiânico na arte, e obras em busca de configurar um estandarte para valores que para o bem ou para o mal, de forma inegável, deixaram de significar e ser o que outrora foram, certamente poderíamos apresentar este trabalho de resistência da "presença" como um ícone para este lugar do pensamento.Estar presente no mesmo espaço onde materialmente nosso corpo habita e cronologicamente nossa mente está situada, em um mundo convencido, não sem luta, que tempo é dinheiro, carrega qualquer coisa de heroico sim. Entretanto, não evoco o lugar-comum de um heroísmo típico, estamos longe do estilo capa-espada vazio e em geral fascista.Aqui, ao contrário do movimento clássico de resgate dos desgraçados, o teatro performativo de Matteo Bonfitto, consciente das dinâmicas formais e aparatado pela simplicidade, alcança um outro tipo de gesto nobre.Através de uma curiosa dramaturgia povoada por imagens que pululam até que haja uma tácita consciência em nós, utilizando preciosos vazios durante o desdobrar das cenas, as imagens, quase sempre orgânicas, acabam por criar uma definitiva simpatia entre público e atuador.As questões do narrador-personagem passam a significar atravessamentos do palco para a plateia e da plateia ao palco. Sem caráter pedagógico ou forma disciplinadamente dialógica, sem discurso técnico ou atmosfera reconhecível, ainda assim, torna-se próximo sem tornar-se um experimento vulgar. O trabalho exerce forte influência na capacidade do público em compreender questões da comunicação humana.E com o tempo, plasticamente, segue revelando uma humanidade que, embora constantemente saqueada peja dureza da realidade, reajusta sua medida, também por isto, a cada impossibilidade surgida dentro do processo de humanização e manutenção da humanidade dos seres humanos.A luz, composta por claros e escuros que revelam ou ocultam códigos visuais, é também metáfora para o que dizemos quando falamos ou para tudo aquilo que deixamos de ver quando de fato enxergamos o mundo concreto que nos cabe enxergar.Assim como artistas marciais podem acessar outras dimensões de percepção através de exercícios meditativos, exaustão física ou respiração disciplinada, embarcando no contexto da obra, esvaziando as palavras que discutem as palavras e atravessando os signos visuais que a obra nos oferece e administra com precisão, é possível também visitarmos outro tempo, filosoficamente, regido por outras leis naturais, sobretudo, quando nota-se o esforço do artista por trazer à cena uma partitura simples para quem assiste e complexa para quem se destinou a realizá-la.

foto Leo Brant

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