Primeiro sinal
No escuro do avião, a constatação de que apenas eu não estou quieto, dormindo ou tentando, teclando e iluminado. Todas as luzes individuais estão apagadas. Todas as telas da aeronave estão desligadas. Hora um banheiro se acende, hora outro, e só. No alto, as pequenas lâmpadas amareladas marcam matematicamente os assentos. Lotado de pessoas das mais diversas, a vontade é descobrir o que leva cada uma a estar no voo. Para onde? Para o quê? Para quem? Existe nesse sono coletivo o esgotamento do cotidiano, portanto da realidade? Existe nesse silêncio abismal, cujo único som é o da máquina em atividade, a mudez da vontade por desaparecimento por algumas horas? Talvez nada disso. Vai ver é só eu encenando o existir do outro como se o mundo fosse demasiadamente fácil e simplório demais para ser apenas literal. Eu e minha mania em achar que a poesia pode sim reconfigurar qualquer coisa e dar-lhe sabores mais interessantes. Eles dormem ou se silenciam, não importam. Eu observo e só consigo mesmo pensar o quanto o escuro do avião é igual ao blackout que antecede o início de um espetáculo. Dessa vez, com centenas de atores improvisando sobre suas próprias histórias. Espere! Um homem levantou a películas que tampava sua janela. Entra a luz. É dia já.