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O mundo é um só

Sair de casa. E encontrar por aí tantas outra possibilidades de se estar em casa. O que parece, para muito, impossível, é um tanto mais fácil para nós. Pois não se trata da casa ser apenas um lugar. É mais. E também não se limita a ser um estado. Há quem diga ser casa todo espaço onde se encontra segurança, intimidade e coisa e tal. Casa, nesse momento, é o lugar-estado em que nos faz habitar a nós mesmo, naquilo que melhor nos reconhecemos. O teatro. A sala de espetáculo. A plateia e palco. Os corredores e bastidores. As ruas. Os espaços improvisados. São muitos, e por serem muitos, e por serem especiais, são impossíveis de estarem limitados em uma lista. São próprios e experiências únicas, e cada um contém em si a própria frase completa feito uma provocação singular incomparável. Sair da casa lugar, real, concreta, ali no canto de São Paulo, e chegar às casas estados em outras muitas cidades, algumas ainda a serem desvendadas, outras residências antigas ao corpo e lembrança. A viagem começa assim. Em busca do teatro que está logo ali, simplesmente atravessando o oceano. E pra lá vamos. Eu, Patrícia e a Antro Positivo. Isso, porque recebemos convites para frequentarmos diversos festivais espalhados pela Europa. Aceitamos, claro. Recebemos, então, convites para que escrevêssemos e pensássemos sobre os espetáculos nesses diversos festivais. Aceitamos com prazer maior ainda, claro. Recebemos o convite para experimentarmos junto a eles as formas de crítica mais radicais que desenvolvemos nesses anos. Aceitamos surpresos e desesperados. Desta vez com medo dos idiomas, das diferenças culturais, do ineditismo do que propomos aos próprios artistas que, curiosos, provocam e nos devolvem os desafios com suas ideias, em um interessante jogo de fortalecer a ambos os lados, pensamento e arte. Medo, como dito, na verdade é uma palavra limitadora demais. Talvez melhor trocá-la por ansiedade. Ansiosamente sedentos por construirmos tantas casas nossas por aí, uma vez que nos convidaram a entrar e nelas existir, que os convites, amadurecendo nesses meses, ganhou ainda mais ares de ser uma aventura realmente especial. E é. Especial por terem nos encontrado, observado, reconhecido, o que só podemos agradecer aos festivais e cada um dos envolvidos. Aventuresca, sim, pois, afinal, cruzaremos o Atlântico, chegaremos de alguma forma ao passado e ao que certamente será descoberta e futuro de muitos artistas no Brasil. Há nesse convite duas possibilidades, apenas. Ficar e se lamentar, fugindo do outro apenas por ser outro, desculpando-se com proteções através de acusações de imperialismos e colonialismos, quando curiosamente muito dos pensamentos em que se apoiam os que condenam vêm dos mesmos lugares que tanto ofende aos puristas da cultura local. Sim, já fomos acusados disso, de olhar o artista de outro país como quem é devoto por ele de outro lugar; de ser discípulo de críticos de outro lugar, apenas por aceitar ouvir o que diferentemente propõe e reconhecer em alguns momentos coisas interessantes e inteligentes. Ou, então, como é mais nosso jeito mesmo, podemos ser ruídos e criação. Preferimos pegar o avião. Levar a revista conosco e ser ela a eles uma deliciosa e irônica colonização às avessas. A viagem começa. Ansiosos, já disse? E dispostos a virarmos o velho mundo de ponta-cabeça. A Antro Positivo hoje, com seus quatro anos, apenas, começa ter como casa definitivamente também a Europa.

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